Capítulo Completo: As Águas que Separavam
1. A Fronteira no Deserto
No extremo sul do Saara, onde o deserto encontra as margens do Rio Senegal, as linhas de fronteira sempre foram mais teóricas do que reais.
Durante o período colonial, a delimitação territorial entre as possessões francesas e espanholas — e posteriormente entre Mauritânia e Marrocos — deixou lacunas jurídicas e sobreposições de mapas.
Embora a disputa tenha sido relativamente silenciosa, as tensões aumentaram na década de 1970, quando a descolonização do Saara Espanhol aproximou as fronteiras de territórios ricos em recursos pesqueiros e rotas comerciais.
2. A Faísca
Em 1975, com o fim da presença espanhola e a assinatura dos Acordos de Madri, Marrocos passou a administrar parte do território que a Mauritânia considerava sob sua influência histórica.
As áreas próximas à foz do Rio Senegal ganharam relevância estratégica:
Água para irrigação em regiões áridas.
Pesca artesanal vital para comunidades locais.
Potencial de hidroenergia compartilhada com o Senegal.
A ausência de uma definição clara de soberania alimentou desconfianças e pequenos incidentes fronteiriços.
3. A Negociação que Poderia Ter Sido
Historicamente, não houve um tratado abrangente entre Marrocos e Mauritânia sobre essa região. Mas especialistas em diplomacia acreditam que, se um acordo tivesse sido firmado nos anos 1970, poderia ter incluído:
Delimitação Mútua da Fronteira – traçada com base em critérios geográficos e etnográficos.
Uso Compartilhado das Águas – quotas de irrigação e pesca definidas anualmente, em cooperação com o Senegal.
Zona Econômica Especial Binacional – permitindo exploração conjunta de salinas, pesca e comércio transfronteiriço.
Corredor Cultural e Comercial – incentivando caravanas e intercâmbio entre comunidades nômades.
4. Os Benefícios Perdidos
Se esse pacto tivesse sido implementado, possivelmente teria:
Evitado atritos diplomáticos durante o conflito no Saara Ocidental.
Estabilizado comunidades fronteiriças e reduzido contrabando.
Criado um modelo pioneiro de gestão hídrica e econômica no Sahel.
5. Lições para o Futuro
Hoje, apesar da disputa ter perdido centralidade, a gestão compartilhada de recursos hídricos no Sahel continua sendo um tema crítico.
A experiência não vivida entre Marrocos e Mauritânia serve de lembrança:
“Quando a água é escassa, ela pode separar ou unir. Depende apenas da sabedoria de quem a administra.”
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